quarta-feira

Samsara

Que motivo de riso, que alegria pode haver neste mundo eternamente inflamado pela paixão? Envoltos em trevas, não procurais uma tocha? Olhai esse corpo coberto de males, encolhido, doente, alimentando projetos sem fim, embora já não seja firme, nem reto. Frágil é essa forma exterior, sujeita à velhice: verdadeiro ninho de enfermidades. A corrupçãp desagrega o corpo, e a morte é a sua vida. Que prazer pode haver em contemplar esses ossos esbranquiçados, semelhantes a abóboras lançadas ao outono? Os ossos formam o arcabouço interno: a carne e o sangue, o revestimento externo dessa cidadela na qual residem a velhice e a morte, o orgulho e a hiprocrisia. Envelhecem as carruagens dos reis, magnificamente ornamentados, como envelhece, também o corpo do homem. Só a virtude dos sábios não envelhece.
Assim como os frutos maduros ameaçam cair das árvores, também aquele que nasceu está sempre sob a ameaçã da morte. Assim como o destino de todo vaso, saído das mãos do oleiro, é partir-se, o da vida dos seres é acabar-se. Assim como o vaqueiro tange com sua vara o gado para o estábulo, também a velhice e a morte vão tocando para a frente a vida dos homens.
Longa é a noite para aquele que vela. Longo, o caminho para o que está fatigado. Longa, a sucessão das existências para os desgraçados que não conhecem a verdadeira Lei! O que é que julgais, ó discípulos, seja maior: a água do vasto oceano, ou as lágrimas que vertestes quando, na longa jornada, errastes ao acaso, de renascimento em renascimento, unidos àquilo que odiastes, separados daquilo que amastes? A morte de uma mãe, a morte de um pai, a morte de vossos filhos, a perda de vossos bens, tudo isso, através de idades e idades, já tendes experimentado! E, enquanto através de idades e idades o experimentastes, mais lágrimas vertestes do que há de água no vasto oceano.
Não tardará muito, ai de ti! Teu corpo há de jazer sob a terra, vil, inconsciente, como um pouco de lenho imprestável! Agora, és uma folha amarelecida. Cercam-te os companheiros de Yama. Estás de partida, e não tens provisões no teu farmel! De pé! Desperta! Poderá haver sono para os enfermos varados pelas flechas do sofrimento? Refugia-se em ti mesmo como numa ilha. Mãos à obra! Toma juizo! Quando sem mácula, sem pecado, chegarás ao mundo divino dos Arhats. Tua via se acaba, chegas ao fim, não podes parar - e não tens provisões no teu farmel! Refugia-se em ti mesmo como numa ilha. Mãos à obra! Toma juízo! Quando sem mácula, sem pecado, não mais estarás sujeito ao nascimento nem à morte.

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